O povo nordestino que colonizou o Acre andava pela mata sem perceber os sinais em seu caminho. Um galho quebrado, um risco na casca de uma árvore, folhas no chão, tudo imperceptível aos olhos não treinados do homem branco.
Era o jeito indígena de deixar recado. Só com o passar dos anos, no confronto e na convivência com aqueles povos, foi que o homem branco aprendeu um pouco dessa linguagem. E ficou sabendo que alguns cantos que ouvia na mata não eram de pássaros. E que algumas batidas nas “sapopembas” não eram feitos por animais ou galhos que caíam. Era telégrafo de índio. E que aquele som agudo e contínuo, como de uma buzina, não era feito por encanto ou assombração. Era a corneta do índio, feita com rabo de tatu e conarara.
No final do século passado não havia cidades no Acre. Em alguns vilarejos, entrepostos comerciais da borracha, poucas casas de madeira perfilavam-se na beira do rio. O território pertencia à Bolívia, era uma espécie de Sibéria para qual nenhum funcionário público queria ser enviado. Ainda assim, chegou a ter um jornal “El Acre”, impresso em rudimentar prensa de madeira.
O jornal era um porta-voz da Bolívia e trazia todos os atos oficiais. Alguns exemplares da publicação sobreviveram ao tempo, mas hoje restam apenas cópias do El Acre, que era impresso em papel tamanho A4, com quatro páginas. A primeira edição circulou em 20 de outubro de 1901, na cidade de Puerto Alonso, hoje Porto Acre, que então fazia parte do território boliviano.
O conteúdo falava sobre a borracha, chamada de goma elástica, com quadros estatísticos e outros dados sobre produção e comércio do látex. Havia também uma coluna de “interesses militares” e notas com observações da vida local.
Mas a indústria nascente na Europa queria borracha e os brasileiros não paravam de chegar. Em breve, reivindicam a posse do território. O cearense José Carvalho liderou a primeira insurreição em 1899. No mesmo ano, o espanhol Luis Galvez organizou o Estado Independente do Acre, que sobreviveu até março de 1900. E dois anos depois o gaúcho José Plácido de Castro liderou uma luta que conquistou definitivamente o Acre para o Brasil. Em todos esses episódios, os manifestos, artigos, cartas, hinos, poesias e polêmicas ocuparam as páginas dos jornais de Belém, Manaus e até do Rio de Janeiro.
As vilas crescem, com o comércio e a chegada das instituições e repartições públicas. E não tardam a surgir os jornais. Desde O Progresso (1904) e O Acre (1907), os títulos se multiplicaram. Periódicos ou episódicos, não importa; o fato é que o Acre jamais viveu sem imprensa. A maioria do povo até podia viver no analfabetismo, mas a minoria alfabetizada gostava de ler, escrever e publicar. É claro, havia muita política e muito jornal panfletário anunciando o fim do mundo, além da imprensa oficial em que o governo dizia que estava tudo bem. Mas havia também poesia e crônica, opinião e análise, montanhas de informação em que hoje se deliciam os historiadores.
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